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Economia

Redução da jornada: quando a promessa vira risco estrutural para empresas, empregos e para o próprio país

Redução da jornada: quando a promessa vira risco estrutural para empresas, empregos e para o próprio país

A discussão sobre a redução da jornada de trabalho sem corte de salários voltou ao centro do debate nacional. É natural que propostas com apelo social ganhem força em momentos de tensão econômica, mas isso não dispensa o país de avaliar de forma séria os impactos reais desse tipo de medida.

No Brasil, especialmente, onde a produtividade é baixa, a carga tributária é elevada e o ambiente de negócios ainda luta para se modernizar, esse debate precisa ser conduzido com serenidade — e com matemática simples.

A economia brasileira está há décadas praticamente estagnada. Enquanto isso, países como China e Índia avançaram com enorme velocidade, ampliaram sua participação no PIB mundial e demonstraram que crescimento não acontece por decreto, e sim por investimento consistente em tecnologia, inovação e qualificação de mão de obra. O Brasil, ao contrário, enfrentou juros altos, crise fiscal, burocracia pesada e dificuldade em modernizar seu parque produtivo. O resultado é conhecido: produtividade baixa, perda de competitividade e fuga de investimentos estratégicos.

É nesse contexto frágil que se discute reduzir jornada sem aumento equivalente de produtividade.

Menos horas, mesmo custo — a equação da perda competitiva


A lógica econômica é direta:

Se a jornada diminui, e o salário permanece igual, e a produtividade não aumenta, então o custo do trabalho por unidade produzida sobe imediatamente.

Esse aumento é especialmente crítico para setores intensivos em mão de obra, como indústria, varejo e serviços essenciais, onde a margem é naturalmente comprimida e a competição internacional é implacável.


Empresas pressionadas por custos têm apenas três caminhos:

1. Repassar o custo ao consumidor, gerando inflação,

2. Enxugar quadro ou reduzir expansão, afetando geração de empregos,

3. Deslocar investimentos para países mais competitivos, acelerando a desindustrialização.


Nenhuma dessas alternativas fortalece o trabalhador. Todas, direta ou indiretamente, o prejudicam.


Por que outros países podem reduzir jornada e o Brasil não?

A comparação com economias desenvolvidas costuma ser usada como argumento. Mas falta honestidade intelectual nesse paralelo.


Países que reduziram jornada vivem outra realidade:

▪Altíssima produtividade por hora trabalhada;

▪Ampla adoção tecnológica;

▪Forte capacidade de investimento;

▪Estrutura tributária mais racional;

▪Sistemas educacionais robustos;

▪Estabilidade institucional;

▪Custos logísticos menores.


Em resumo: eles produzem mais com menos.


Já o Brasil ainda está preso em dificuldades que impedem o ganho de eficiência. Sem resolver esses gargalos, qualquer redução de jornada tende a amplificar problemas existentes, não a resolvê-los.


O impacto no ciclo econômico: do custo ao bolso do cidadão

É importante destacar um ponto central: a economia é um sistema interligado.

Quando o custo sobe, ele se espalha pela cadeia produtiva até chegar ao consumidor final.

No comércio, nos serviços, na indústria, na alimentação, na educação — em tudo que o trabalhador consome.

Se empresas precisam contratar mais pessoas porque têm menos horas disponíveis, ou se precisam operar com menor capacidade produtiva, os preços sobem.

E, em um país de renda média como o Brasil, qualquer aumento de preço impacta diretamente o padrão de vida da população.

Ou seja, a proposta que hoje parece um benefício pode se transformar rapidamente em:


▪Inflação;

▪Perda de poder de compra;

▪Retração de investimentos;

▪Menor oferta de empregos.


Um benefício ilusório, com custo real.


Produtividade: o caminho sólido, sustentável e responsável

Se o objetivo é melhorar a vida do trabalhador, existe apenas um caminho consistente:

aumento de produtividade.


Isso envolve:

▪Modernização tecnológica;

▪Qualificação contínua;

▪Políticas industriais focadas;

▪Ambiente de negócios eficiente;

▪Crédito acessível;

▪Estabilidade regulatória;

▪Menor complexidade tributária.


Quando a produtividade sobe, os salários sobem de verdade — não por decreto, mas por capacidade econômica. E, nesse cenário, uma eventual redução da jornada pode ser sustentável e positiva.

Mas fazer isso antes de resolver esses desafios é inverter a ordem natural das coisas. É tentar colher antes de plantar.

Conclusão: soluções fáceis criam problemas difíceis


O Brasil não pode repetir erros históricos. Em vez de buscar atalhos populistas, o país precisa encarar seus desafios estruturais com maturidade e compromisso com o futuro.

Reduzir jornada sem aumento de produtividade pode gerar manchetes positivas no curto prazo, mas cria um rastro de dificuldades no médio e longo prazos — para empresas, para trabalhadores e para a economia nacional.

Não existe desenvolvimento econômico sustentável sem competitividade.

Não existe competitividade sem produtividade.

E não existe produtividade sem investimento, tecnologia e qualificação.

O debate deve ser transparente e baseado em realidade, não em slogans.

A prosperidade do país depende de escolhas racionais — e a escolha racional, neste momento, é fortalecer a base produtiva, não enfraquecê-la.


Edson Vasconcelos

Presidente do Sistema Fiep

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