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Por que Sbaraini não paga?

Documentos demonstram que empresário tem recursos no exterior para quitar boleto bilionário; Eduardo Sbaraini ensaiou pagar, mas não compareceu

A Sbaraini Capital tem ativos glosados pela Operação Ouranós, da Polícia Federal (PF) desde novembro de 2023. Seus mais de 16 mil clientes lesados estão sem acesso aos recursos financeiros que investiram desde então. 

O cascavelense Eduardo Sbaraini, dono do negócio, veio a público em janeiro para tranquilizar o mercado, afirmando que seu patrimônio pessoal poderia ser usado para restituir os valores. O verbo permanece no futuro do pretérito: poderia. Ninguém viu a cor do dinheiro que era remunerado em até 3% ao mês. Há muitos cascavelenses pendurados nesta brocha, mas a maioria dos clientes são do Rio Grande do Sul - um dos gaúchos tem mais de R$ 40 milhões “congelados”.

Fato novo no imbróglio, o Pitoco teve acesso a informações do inquérito da PF. Nas reproduções devidamente autenticadas, algumas informações cruciais:

  • A PF chegou ao destino final do dinheiro dos clientes: os recursos, mais de R$ 2,7 bilhões, estão no exterior em criptomoedas. Policiais chegaram a fazer uma operação de 100 dólares para checar se a conta pode ser movimentada e se valores podem ser transferidos para os credores no Brasil através de uma conta da Sbaraini no Bradesco. Deu ok, a conta está ativa e a dinheirama disponível.
  •  Para a PF, são consistentes os indícios de que o não pagamento aos investidores “é decisão exclusiva dos investigados”.
  • O total devido a cerca de 16 mil clientes é algo próximo de R$ 2,6 bilhões, mais de R$ 100 milhões menor que o montante no exterior. Portanto, Sbaraini tem recursos para pagar todos, com sobras multimilionárias.

A pergunta é: por que a Sbaraini Capital não quita o boleto bilionário e tira seus clientes do sufoco, já que esses recursos no exterior estão fora do alcance do bloqueio judicial? Aqui está uma pergunta que somente o cascavelense, neto do “seo” Benjamim, pode responder. Uma suposição aventada por causídicos consultados pelo Pitoco dá conta que a repatriação desses recursos implica riscos. Um deles é uma sentença judicial bloqueá-los imediatamente após disponibilização no Brasil. Mas tudo são hipóteses.

FARAÓ DO BITCOIN

Esse mundo dos bilhões em moedas virtuais ou digitais é mesmo complexo e escorregadio. Suspeita-se que Sbaraini entrou no radar da PF ao adquirir uma empresa antecessora, a MK Capital, esta sim grampeada na operação que trouxe abaixo o império do tal “Faraó do Bitcoin”, Glaidson Acácio dos Santos, acusado de montar uma pirâmide financeira. “Vou devolver o dinheiro das pessoas”, disse o Faraó após ser preso, em agosto de 2022. Até agora, nada.

Vale ressaltar: a PF não configurou as operações de Sbaraini como piramidais. Pelo contrário, se ele pagava juros elevados aos investidores, da ordem de 3%, pelo montante que a empresa movimentou em caixa, poderia estar auferindo até o dobro deste percentual nas operações com criptomoedas. A suspeita é de um “furo” no compliance da Sbaraini Capital, que pode ter permitido a infiltração de lavadores de dinheiro. Isso a Operação Ouranós ainda precisa comprovar.

OUTRO LADO

“Em virtude da demora no processo para liberação dos recursos informo que contratei um profissional para avaliar meu patrimônio pessoal, que será intregralmente colocado como garantia dos valores retidos pela Justiça, de forma a não deixar qualquer investidor descoberto”, disse Eduardo Sbaraini em nota.

Em tempo: a fala do cascavelense é contraditória com o inquérito da PF neste ponto. A polícia sustenta que os ativos de maior liquidez (criptos) não estão retidos, e poderiam, em tese, ser utilizados para pagar os credores.

 

Benja, o avô bilionário

“Meus filhos, quando pequenos, eram tão bonitos que eu tinha vontade de comê-los. Hoje me arrependo de não tê-los comido”

 

Não se sabe ao certo quanto dinheiro Benjamim Sbaraini, o avô de Eduardo, acumulou. Mas é crível dizer: se hoje o patrimônio dos herdeiros chega aos dez dígitos, certamente os primeiros bilhões foram produzidos por Benja, como era conhecido entre os mais íntimos.

O Sbaraini avô já chegou ao mundo em berço esplêndido. O pai dele, conhecido como “Barainho”, era dono de um imóvel na foz do rio Iguaçu, ponto que deu nome à cidade, e atuava com exportação de madeira na primeira metade do século passado. 

As informações contidas aqui são provenientes de uma entrevista inédita concedida pelo melhor amigo de Benja, Altamir Silva, obtida em 8 de fevereiro de 2021. Naquela ocasião, “Altamire”, como era chamado por Benja, aos 87 anos, recebeu o Pitoco em seu apartamento na rua Mato Grosso, centro de Cascavel.

Altamir Silva, também conhecido como “Grandão”, do alto de seus 1,86m, foi o primeiro presidente da Acic. E era companheiro de garrafa do Benja. 

“De repente tocava o telefone. Era o Benja, que logo dizia: - Não vai vir, Altamire? Era o convite para eu ir até o casarão dele no Country bebericar um Johnnie Walker selo preto”, conta o “Grandão” em seu vozeirão grave.

Aqui estão alguns trechos da entrevista histórica concedida por Altamir Silva ao Pitoco há três anos, e que traça um perfil curioso deste personagem central do ciclo da madeira, Benjamim Sbaraini, o avô do Eduardo.

ORIGENS

“O Benja morava em Buenos Aires, comandando por lá as exportações de madeira. Casou-se com a argentina Marta e morou em Porto Alegre uns tempos até vir para cá. O pai dele, Barainho, já era um homem muito rico. O conheci em Foz do Iguaçu, mexendo com exportação.”

SELO PRETO

“Chegava perto das 5 da tarde e Benja já abria o litro de Johnnie Walker. Um paraguaio que trabalhava para ele trazia caixas de whisky. Ele era pão- -duro. Se eu quisesse uma garrafa, tinha que pagar. Benja costumava dormir cedo. De vez em quando gritava lá do quarto: - Marta, nesta casa não se f. mais? (risos).”

FORTUNA E SAIAS

“Ele gostava de boi e de dinheiro. Dinheiro tinha que era um inferno, muito dinheiro, nem sabia quanto tinha. Um pouco ele gastava. Estávamos dando conta de um litro na mansão do Country quando ouvi ele dizer no telefone: - Fulana, desça no primeiro portão, deixa o carro lá. Depois venha para o segundo portão, fale com o guarda e venha. Altamire, tá na hora de você ir embora!” 

OS HERDEIROS

“Os filhos nasceram muito ricos, então ele mandou todo mundo estudar fora. Tinha uma frase que o Benja gostava de repetir sobre a prole. Era assim: - Meus filhos quando pequenos eram tão bonitos, mas tão bonitos, que dava vontade de comê- -los. Hoje me arrependo muito não tê-los comido.”

 

“Temos um caminho” 

  • Centenas, talvez milhares de lesados pela retenção de recursos na Sbaraini Capital buscaram as barras da lei para reaver seus investimentos. Escritórios de advocacia do Brasil todo entraram na causa.
  • Um dos escritórios está em Cascavel, o Boschirolli & Gallio, que defende mais de duas dezenas de lesados em demandas que chegam a R$ 65 milhões. Especialista em casos intrincados como esse, o advogado Alex Gallio (foto) viu repercutir uma de suas petições cujo embasamento lhe trouxe investidores de todo o país na tentativa de reaver o dinheiro aplicado.
  • O escritório levantou e arrolou o patrimônio pessoal de Sbaraini para obter as garantias necessárias. Gallio assegura que há um caminho para os clientes receber as aplicações mesmo com os recursos no exterior, mas obviamente não entrou em detalhes para a reportagem. 
  • Os operadores do direito estão cautelosos e econômicos com as palavras, já que em um pólo está a PF, em outro alguns dos advogados mais bem pagos do país contratados pela Sbaraini Capital.
  • O que se sabe, afora a encrenca com o legendário Faraó do Bitcoin, é que havia muitos interessados em minar a ascensão do neto cascavelense do Benja no mercado financeiro: A Sbaraini cresceu rápido, e passou a atrair alguns dos melhores quadros da XP e da BTG Pactual, players nacionais do segmento.
  •  Como esses operadores levavam com eles suas carteiras de clientes para a Sbaraini, havia gente grande e influente empenhada em contê-los. Se isso é mera teoria da conspiração ou não, só o tempo e as investigações irão dizer.