
Região Oeste já “comeu bola” em duas duplicações essenciais
Entenda como o Oeste perdeu duas obras logísticas importantes, está prestes a perder uma terceira, e porque Cascavel como cidade polo é o município que mais sente os impactos

A Fiep está desenvolvendo uma ferramenta para evitar novas surpresas no conturbado histórico de concessões de rodovias no Paraná.
É o Observatório das Concessões, que irá georeferenciar todas as obras do contrato, acompanhar o cronograma de execução, colocando lupas nas atas, aditivos ou qualquer movimentação suspeita.
O detalhamento da iniciativa foi divulgado na entrevista concedida pelo presidente da entidade, Edson José de Vasconcelos, no Pitocast, o podcast do Pitoco, gravado no último dia 7 de março.
A ausência de uma ferramenta desta natureza, disponibilizada em tempo real para imprensa e para a sociedade, permitiu duas “tungas” históricas, com severas consequências para o Oeste do Paraná.
Uma delas aconteceu em 29 de julho de 2004, no governo Requião, quando o Palácio Iguaçu assinou aditivo desobrigando a então concessionária EcoCataratas de concluir a duplicação da BR 277 entre Foz do Iguaçu e Cascavel. A outra é mais recente, no dia da Proclamação da República, em 2015, a duplicação da rodovia 369 entre Cascavel e Campo Mourão “anoiteceu no contrato”, mas amanheceu em outra região, no Norte do Paraná, base eleitoral do então governador Beto Richa.
Agora, embora fora do escopo das concessões, Cascavel pode perder mais uma obra essencial, a sequência do anel rodoviário, caso suas lideranças batam cabeças ou sejam devoradas pela inação.
O Observatório das Concessões terá o desafio de previver “surpresas”, e será uma pedra no sapato dos ligeiros, que já aprontaram na concessão atual, conforme descreve na entrevista concedida por Vasconcelos ao Pitocast, conforme segue:
Pitoco - O Observatório das Concessões passou a operar mais estruturado recentemente, porém desde os primeiros leilões já flagrou anomalias…
Edson Vasconcelos - Sim, a falta de acompanhamento já cobrou um preço perceptível. Os lotes 1 e 2 das concessões já apresentam mudanças sobre o que foi dito nas audiências públicas. Tiraram a conectividade por wi-fi, simplesmente o ítem sumiu do contrato, e também passaram a cobrar o pedágio antes de concluir as obras preliminares, antecipando uma receita de quase meio bilhão de reais.
Que outros instrumentos a sociedade dispõe para acompanhar as concessões?
O Paraná é hoje o estado mais maduro para discutir esse tema, temos um contrato robusto que prevê comissões tripartites em que a sociedade civil está representada. O dilema são os interesses políticos e eleitorais que vão pôr à prova o sistema.
E como esses interesses podem ser fomentados?
Na troca de governo, por exemplo, natural que um novo governante diga: esse cardápio de obras do contrato foi escolhido por um outro gestor, quero contemplar meus compromissos aqui, vou pressionar a concessionária.
E como resolve isso?
A comunidade precisa acompanhar, ocupar seu lugar de forma qualificada na comissão tripartite. Haverá sim espaço, janelas de oportunidade para adequações no contrato, isso está previsto. Mas é preciso atentar para que sejam tecnicamente viáveis, não por interesse empresarial, do mercado imobiliário ou do “mercado” do voto.
É importante que a sede da EPR, a nova concessionária aqui da região esteja em Cascavel?
Pouco influencia se a sede está aqui, tem que entender que o relacionamento com as concessionárias tem um linha de corte, que se chama contrato. Nada que vá pedir lá e que esteja fora do contrato, ela vai dar. Não adianta dizer “me faz mais uma obrinha aqui que tá morrendo gente”. Ela não vai dar.
Por falta de transparência e acompanhamento perdemos a duplicação da 277 e da 369…
Perdemos a duplicação da 369 de Cascavel a Campo Mourão no dia 15 de novembro de 2015. A obra foi mudada para Nova Londrina e Paranavai. Essa perda e a da conclusão da duplicação para Foz do Iguaçu tem um efeito econômico de isolamento cultural e econômico.
Como assim?
Um pai põe a família no carro para um passeio ou para contratar um produto ou serviço em uma cidade polo. Ele está em Campo Mourão. Olha para as rodovias, percebe que até Maringá está duplicado. Para Cascavel, quase a mesma distância, pista simples. Ele vai para Maringá.
Consequências?
Quebra uma cultura, os filhos que estão no carro criam vínculos com o Norte do Paraná, nunca virão para Cascavel, não estabelecem vínculo afetivo conosco. O mesmo exemplo serve para o morador de Medianeira para escolher entre Foz e Cascavel, consequências econômicas na veia.
Contorno Norte ou Sul?
Talvez ambos. É possível pacificar o tema, não há concorrência entre os trechos. Há uma lógica temporal de cada um deles, precisamos entender os fluxos para um planejamento de longo prazo. O arco norte oferece saídas para Toledo, Tupassi, Maringá, ao passo que o Sul liga com o Rio Iguaçu, área sensível, com baixa taxa de ocupação no plano diretor em razão se concentrar nossa bacia hídrica ali e pelo relevo.
Não é o caso para uma disputa paralisante entre nortistas e sulistas?
De forma nenhuma, em uma linha de tempo planejada a médio e longo prazo encaixa-se perfeitamente o Contorno Sul. É encontrar seu lugar no tempo.
Que fazer ao Sul?
As obras previstas no escopo da concessionária da rodovia, prevendo duplicar o perímetro urbano da 277 na região Sul, podem oferecer ali uma grande avenida com transposição em nível, semaforizada, eliminando a secção que hoje se observa naquela região.
Sem guerra então?
Ninguém tá lutando contra o contorno Sul. A logística não permite equívoco: não se faz um trem onde não tem carga, não pode fazer contorno onde não tem fluxo. A partir de critérios objetivos ajusta-se na linha do tempo o que sai primeiro. É preciso ter clareza de combinar o jogo para não perder os recursos do governo do Estado.
A bola está com quem agora?
Está com o prefeito Renato Silva. Ele tem que liderar esse processo. A prefeitura recebeu informações técnicas que iluminam o tema. O prefeito é o mandatário. É focar em executar o projeto e levá-lo em caravana para o governador, como fizeram outras regiões e foram atendidas. Não podemos esperar para a semana que vem para ver como fica, não temos esse tempo.